Um novo mundo é possível. A máxima foi recorrente durante a primeira grande conferência do II Fórum Mundial de EPT, com o tema “Educação, universalização e democratização”, na manhã desta terça-feira (29). Uma esperança necessária, segundo os próprios conferencistas, diante do cenário traçado principalmente pelos dois primeiros, a portuguesa Rosa de Jesus Soares Bastos Nunes (terceira da esq. para a dir.) e o inglês Peter Jarvis (de blazer preto). Também participaram o conferencista brasileiro Carlos Augusto Abicalil (à esq.) e, como mediadora, a presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), Manuela Braga (à dir.).
Para Rosa Nunes, doutora em Ciências da Universidade do Porto, o sistema capitalista é o eixo sobre o qual se sustenta a problemática da educação, que tende a justificar a situação social dominante. No mundo capitalista “não escolhe quem quer, escolhe quem pode”, afirmou Rosa, lembrando que isso vale para o aspecto social, do trabalho e também da educação.
A portuguesa enfatizou que, para ser democrática, a educação tem que ser um bem de acesso público. Do contrário, configura-se uma das formas mais cruéis de segregação, o “racismo do conhecimento”, que, segundo Rosa, é promovido pela classe dominante: “Impera um silêncio. Não de alguém que é impedido de dizer o que queria, mas o silêncio de alguém que não tem como dizer aquilo que deveria”, filosofou.
Peter Jarvis, professor das universidades de Surrey e Nottingham, na Inglaterra, também procurou mostrar em sua fala as consequências de um sistema educacional dominado pelo capitalismo global, mais propriamente por um núcleo, um eixo formado por grandes corporações que centralizam o poder no mundo globalizado. “Há um mito na democracia: acreditamos que elegemos aqueles que têm poder, mas o poder não pertence aos políticos.” Segundo ele, nesse contexto as pessoas são vistas apenas como recursos, assim como os naturais, tão vastamente explorados, por essas corporações. “Nas universidades, o conhecimento não é mais para formar pessoas para conduzir uma nação, mas pessoas capazes de cumprir papéis”, afirmou o professor inglês.
“Num mundo da revolução tecnológica, os conceitos são mercado, competição, reestruturação e globalização”, reforçou Rosa Nunes. “Esses conceitos disciplinam e formatam o campo pedagógico atual, os critérios são os da empregabilidade.” Segundo ela, nesse contexto, os conhecimentos não têm valor se não tiverem valor de mercado.
Experiência brasileira
Diante das experiências europeias, o caminhar da educação no Brasil, nas últimas décadas, pode sinalizar para esse novo mundo possível. Foi o que tentou mostrar o professor brasileiro Carlos Augusto Abicalil, em sua fala repleta de menções à Constituição brasileira e à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). “Chegamos a este estágio com muita luta e determinação, com políticas públicas conquistadas, às vezes, na marra”, afirma Abicalil.
No rumo da universalização e democratização, o Brasil deixou claro em seu texto constitucional que a educação é direito de todos. Abicalil alertou que o pronome “todos”, nesse caso, aponta tanto para o sentido público quanto para o subjetivo, ou seja, “de cada um”. Isso implica que, para se realizar democraticamente, o sistema educacional necessita conhecer profundamente a imensa diversidade da realidade brasileira – como as grandes desigualdades entre as regiões brasileiras, para citar apenas um dos exemplos lembrados por Abicalil. “Isso implica necessidade de políticas públicas específicas”, frisou.
Segundo Abicalil, a democratização da educação passa necessariamente pelas condições de acesso, permanência e êxito. E, nesses quesitos, no Brasil “ainda há muito o que se fazer”. (Juliana Paiva)